“Os Experimentos em Animais ATRASAM o progresso da ciência”.

Para TODAS as Mães do Mundo

Não importa onde e nem quando: como apregoa a sabedoria popular, mãe é mãe, e isso não se discute.


A figura materna firmou-se, desde tempos remotos, como verdadeiro ícone imantado a atrair sobre si os mais diversos sentimentos e formas de veneração.

A Pré-História se dividiu em três períodos: o Paleolítico (600 000-10 000 a.C.), o Neolítico (10 000-5000 a.C.) a e Idade dos Metais (5000-4000 a.C.). Segundo a divisão de Lewis Morgan, esses períodos corresponderiam, respectivamente, aos estágios da selvageria, da barbárie e da civilização. O homem do Paleolítico, ou seja, da época da selvageria, desenvolveu rudimentos de vida espiritual. As pinturas das cavernas e as peças de escultura feitas nesse período são relíquias dos ritos mágicos. As esculturas da época da selvageria são toscamente expressivas, mas, em geral, carecem de realização hábil. A mais comum e típica é a chamada “Vênus”, obesa e balofa segundo os padrões atuais de beleza feminina. As “Vênus” de Willendorf e de Menton são típicas. Tais estatuetas podem ter sido figuras votivas ligadas aos ritos destinados a manter e incrementar a prolificidade das mulheres. Desde a época da selvageria, nós, humanos, incentivamos e admiramos a maternidade de nossas fêmeas.

Esse sentimento de quase idolatria pela figura da mãe atravessou os tempos. Embriagados e enlevados, nossos melhores e piores autores produziram pérolas de pieguice sobre o tema, como esta do poeta pernambucano Barreto Coutinho, de 1912:

Eu vi minha mãe rezando
aos pés da Virgem Maria,
era uma Santa escutando
o que outra Santa dizia.

De todo modo, desde a época da selvageria, a veneração à mãe tem estimulado atitudes cafonas, como fazer esculturas grosseiras em pedra, compor trovinhas exangues e, mais modernamente, com a instituição do Dia das Mães, a comprar telefones-celulares em promoção para agradá-las ou levá-las para estourarem suas varizes nas intermináveis filas de galeterias ou churrascarias no fatídico segundo domingo de maio.

Assim como as esculturas da época da selvageria, nossas homenagens às mães são, hoje, toscamente expressivas e carecem de realização hábil. O lado bom de tudo isso é que, seja como for, mesmo sem esperarem nada em troca por sua dedicação, nossas mães são respeitadas e se sentem importantes. As pernas doem, o celular não será de grande utilidade, mas elas ficam felizes.

Porém, algumas mães têm pouca sorte. Passam a gestação em condições degradantes, nada podem fazer quando seus bebês lhes são roubados e talvez até pressintam que nunca mais os verão. Não há dúvida de que isso provoca uma profunda angústia em ambos, mãe e rebento.

“Mas de que mães estamos falando, afinal?”, você deve estar se perguntando. A resposta está logo abaixo.

galinha.jpgMÃE GALINHA: Seus ovos lhe são roubados logo após a postura para serem chocados em incubadoras artificiais. Com apenas um dia de vida, seus pintinhos são levados para as granjas. Menos os pintos machos das galinhas poedeiras, que não são rentáveis para a indústria. Por isso, logo que nascem, são empilhados dentro de enormes sacos, onde vão morrendo lentamente, por asfixia, ou são lançados em grandes trituradores para servirem de matéria-prima para alimentação de frangos adultos ou para fabricação de ração para cães e gatos.

cowcalf.jpgMÃE VACA: Para produzir seu leite de forma contínua, é inseminada artificialmente, ano após ano (hoje em dia, há ainda o método de indução de uma falsa gravidez via injeção de hormônios). Como os bezerros machos das vacas leiteiras não renderiam carne de boa qualidade quando adultos, um fim diferente os espera. Eles são roubados da mãe logo após seu nascimento e confinados em caixotes de madeira, sobrevivendo à base de leite desnatado. Aos quatros meses de “vida”, anêmicos e com músculos atrofiados, são mortos. Sua carne, clara e macia, é conhecida pelo nome de vitela ou baby beef, aquela mesma que nosso querido Bento XVI, do alto de sua santidade, degustou em sua visita ao Brasil.

porcal.jpgMÃE PORCA: Durante a gestação, é confinada numa baia tão minúscula que a obriga a permanecer deitada, sem poder se virar. Fica prenhe, pelo menos, duas vezes ao ano. Seus leitões são desmamados antes de completarem um mês de vida (menos da metade do tempo natural) e imediatamente encaminhados para a engorda. Enquanto amarga a dor da ausência dos filhos, ela é novamente inseminada.

Outro exemplo gritante de desrespeito aos laços entre mãe e filho no mundo atual é a produção de animais para fins de estimação. A lógica perversa é a mesma: cadelas são inseminadas à força, e seus filhotes lhes são retirados poucos dias após o nascimento, para irem parar em “pet shops”. Para cada animal que é comprado, um animal abandonado deixa de ser adotado, vindo a perecer nas ruas ou – pior – nos Centros de Controle de Zoonoses (o eufemismo atual para a não tão boa mas bastante velha “carrocinha”). Quem lucra com isso? Apenas os gigolôs de animais em seu ávido proxenetismo e sua inclemente desfaçatez moral.

Desde o tempo da selvageria, veneramos as mães. Nem todas, claro. As mães não-humanas não receberam, ao longo de todo esse tempo, nem mesmo a indulgência de nossa pieguice, quanto mais qualquer tipo de idolatria.
Toda vez que compramos um pedaço de carne, que compramos aquele poodle cor-de-rosa “tão fofinho” ou aquele labrador imponente, toda vez que usamos couro ou outro pedaço de animal para nos vestir, estamos financiando todas as atrocidades dessa indústria sem ética ou compaixão, que comercializa seres sensíveis e conscientes (vivos ou mortos, conforme a necessidade do freguês), como se fossem sacos de areia ou caixas de pregos.

Talvez seja muito otimismo crer que, um dia, a humanidade consiga dar um passo além, afastando-se do obscurantismo e da selvageria. Todavia, quero acreditar. Acredito em gnomos e OVNIs, no poder das runas e no monstro do Lago Ness; acredito que o mundo é um objeto achatado, apoiado nas costas de uma tartaruga gigante; acredito até na existência de trigêmeos japoneses. Não me custa acreditar na inteligência dos homens (custará, no máximo, uma nova decepção e algumas rugas e pés-de-galinha a mais). Quem sabe, então, ainda em vida, eu não  possa ver um Dia das Mães feliz de verdade – para TODAS as mães do mundo.

Por hora, resta-me engolir em seco e seguir em frente. A vida é assim, sempre foi assim, todos se acostumam, por que eu não? No próximo Dia das Mães, levemos nossas queridas genitoras à churrascaria ou galeteria mais próxima, sem questionamentos filosóficos ou desconfortos morais. É hora do almoço, o suco gástrico borbulha, rilham os dentes: um cadáver é posto à mesa, testemunha indigna de uma história de laço maternal desfeita para saciar nossa fome pantagruélica e, é claro, nossa selvagem e indelével pieguice.

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